Alguém disse que a eutanásia já se prática. Quem? Um pedreiro? Um advogado? Não! A bastonária da Ordem dos Enfermeiros....

A forma como as pessoas abrem a boca aparentemente sem antes medirem as consequências daquilo que vão dizer é algo de extremamente impressionante.

Numa altura em que tanto se adverte as pessoas para que tenham o máximo de cuidado com o que publicam nas redes sociais, para que pensem bem antes de abrir a boca quando estão fora das suas quatro paredes, para que ponderem sobre as consequências que poderão advir das suas declarações públicas, ainda acontecem coisas que me deixam de boca aberta, tendo em conta o estatuto das pessoas de quem partem.

Então vai uma bastonária da ordem dos enfermeiros para os estúdios da Rádio Renascença afirmar que a eutanásia já se pratica em Portugal no Serviço Nacional de Saúde? Que já ouviu médicos sugerirem a administração de uma overdose de insulina a fim de provocar um estado de coma irreversível e, consequentemente, a morte do doente??

Pelos vistos, sim. Pelos vistos, isto efectivamente aconteceu. A senhora efectivamente , durante uma entrevista na referida rádio nacional fez aquelas declarações, na mais pura das descontracções. Como se diz na minha terra, "disse aquilo como quem vai de caminho".

A minha dúvida é esta: será que a senhora bastonária , que certamente quer manter o seu bom nome profissional e consequentemente a harmonia da sua vida pessoal (sim, porque em certos casos, é inevitável que se misturem) pensou que saía daquele estúdio e que não ia haver qualquer vestígio de polémica em torno das declarações que tinha feito?

Atenção que este post não tem o objectivo de reflectir ou suscitar discussão sobre o tema da eutanásia, ou morte clinicamente assistida. Trata-se de um assunto muito delicado e fica para tantos outros posts que há por aí a propósito dele. Nem vou sequer falar aqui sobre a minha opinião a respeito do mesmo. Não é isso que está aqui em questão. Não é o assunto do post.

Aqui , interessa-me única e exclusivamente reflectir sobre o facto de uma bastonária da ordem dos enfermeiros ter declarado publicamente que a prática de algo que actualmente ainda é crime acontece no nosso Serviço Nacional de Saúde. Ora, isto parece-me grave. Mais do que grave, parece-me de uma leviandade alarmante, tendo em conta o cargo que a senhora ocupa. Não se trata de sermos a favor ou contra a eutanásia. Até podemos ser a favor. Mas o facto é que ,até ao momento, a eutanásia ainda não é prática legal em Portugal. Ainda é crime. Ora, se uma bastonária vai para uma entrevista de rádio dizer que ela se pratica no Serviço Nacional de Saúde, que confiança transmite aos utentes do referido sistema?

Já hoje ouvi uma senhora dizer isto, a propósito da polémica "Ora, se eles praticam eutanásia sendo ilegal, não hão-de praticar outras coisas também ilegais na Saúde?" . Acho legítimo que a senhora tenha estas preocupações. Afinal, não ouviu aquilo de uma pessoa que estava num café (pedreiro, cozinheiro, engenheiro, advogado) mas da bastonária da ordem dos enfermeiros, nessa qualidade, numa entrevista de rádio.

Eu própria, cidadã comum , desempregada, que nada tenho a ver com a Saúde a nível profissional, já tenho ouvido dizer por aí que a eutanásia se pratica, ou que se desconfia que se pratica. Nunca ouvi nenhum caso concreto, mas que se diz isso por aí, diz-se. Tal como se dizia, quando o aborto era ilegal, que havia médicos que prescreviam um determinado medicamento usado em gastroentrologia , que tinha como efeito secundário provocar o aborto.

Sim, ouvi dizer isso muitas vezes, tal como hoje em dia ouço que há quem pratique a eutanásia em segredo. Pronto, acabei de dizer uma palavra chave: em segredo. Ainda que eventualmente aconteça, parece-me leviano por parte da bastonária Ana Rita Cavaco referi-lo publicamente numa entrevista de rádio. Principalmente porque isso descredibiliza o serviço de saúde pública. Serviço esse que tem o dever de defender.

Seja contra ou a favor de uma lei, todo e qualquer profissional tem o dever de respeitá-la. A não o fazer, está a incorrer num crime. Além disso, tem ainda o dever de defender o bom nome e a idoneidade da instituição que representa ou a que está ligado.

Podemos defender que a senhora foi corajosa ao denunciar algo que eventualmente sabe que acontece... Mas então, para isso, esperemos que estivesse preparada para as consequências da sua atitude. No entanto, quer me parecer que não estava.

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